coleção e colecionismos
como nossas coleções formam parte da nossa história — e como diversas coleções privadas se tornaram histórias públicas
em seu texto “Coleção”, o historiador Krzysztof Pomian traz definições importantes sobre coleções e museus, que nos ajudam a entender como esses conceitos se assemelham em um primeiro momento e, no entanto, são diferentes entre si.
antes de falar um pouco mais sobre isso, vou falar de duas das minhas coleções mais queridas. creio que trazer minhas próprias coleções vai ajudar a exemplificar algumas das ideias de Pomian.
já coleciono discos e cartões postais há quase 10 anos, e gosto dessas coleções porque representam duas coisas que são paixões minhas: música e viagens. o bacana de colecionar esses itens é que, além do significado que eles possuem pra mim, eles também têm utilidade. quando coloco meu disco favorito dos beatles pra tocar na vitrola, não é só a música que se faz presente, mas todas as lembranças que tenho ouvindo ao disco e relacionadas a ele. e quando revejo os cartões que já recebi, que comprei pra mim ou que envio pra alguém, lembro dos lugares visitados, das pessoas que conheci e dos momentos que vivi.
assim como eu gosto de colecionar essas coisas, no passado os grandes aristocratas, príncipes e pessoas poderosas num geral gostavam de colecionar artefatos históricos, pinturas, insígnias e uma variedade de itens dos locais que conquistavam e dos povos que dominavam. por muito tempo, essas coleções foram privadas, mantidas em propriedade dos seus donos, mas com a inserção desses objetos em museus e espaços de arte, seja por reapropriação ou doação, seu status mudaram e eles passaram a ser públicos, a contar histórias que estavam “escondidas” e que a partir deles se mostram visíveis.
ao transformar objetos históricos e obras de arte em itens de museu, criam se narrativas acerca desses itens expostos. se descobrissem que meus cartões postais são artigos históricos, por exemplo, os organizariam em uma exposição e atribuiriam um significado para eles, tornando-os semióforos. Pomian explica que um objeto em museu é dotado de significado ao mesmo tempo em que não possui utilidade, já que o uso desgastaria o objeto.
ainda sobre meus cartões, caso fossem para um museu, o significado atribuído a eles nem sempre seria interpretado da forma que está ali. como o cartão é uma representação de algo que não tá ali, é uma parte visível de uma história que tá invisível; dessa forma, o cartão não teria só um, mas vários significados, partindo do olhar de cada um que o observa. assim, uma pessoa que já visitou Florença teria memórias diferentes olhando para um cartão postal da cidade comparado a uma pessoa que não a conhece, ou que já foi a muito tempo, ou que só leu um livro sobre, e etc.
para Pomian, portanto, o objeto musealizado difere do objeto colecionável porque tem finalidade cultural e/ou educativa; possui um significado, ou seja, é semióforo; está em exposição para o público, e depende do olhar e da interpretação desse público para visibilizar seus significados.
gostei bastante desse tema e passo a tratar minhas coleções com ainda mais carinho — vai que um dia elas viram pedacinhos importantes de alguma história “maior” do que a minha, né? e você, leitor/leitora, tem alguma coleção ou objeto com muito significado? me conta!
ps: o texto do Pomian tá disponível aqui!